- Trabalho prático do Curso de Tradução 2/2013 -
Uma lagartixa
Juan
Burghi
Tradução:
Claudio Bertocchi,
Débora Gutiérrez, Gabriela Saliva,
Lilián Endrigo, Nancy Nagata, Susana García
Balmore
Coordenação:
Adriana
Almeida
Manhã. Estio.
Reflexo de sol. O pedregal da serra parece ranger no entendimento do lume.
Sobre a superfície de um penhasco liso, como se estivesse se queimando, uma
lagartixa se aquece ao sol. Seu traje de luzes concentra o sol e os esmaltes de
todo um verão e sua presença fala dos três reinos: animal, pois se vê nela uma
bestialidade; vegetal, por se assemelhar a um galhinho verde; e mineral, por
parecer feita de cobre e mica. E também faz lembrar os quatro antigos
elementos: a terra, em sua argila animada; a água, em seu aspecto de poça com
lodo ao sol; o ar vibrátil, no espelho que a rodeia; e o fogo, no vivo flamejar
de seus brilhos.
Assim, imóvel,
hierática, é uma pequena deidade egípcia talhada primorosamente, do solícito
triângulo de sua cabeça de olhos faiscantes, os suportes de suas patas, a serpe
de seu corpo, até o chicote de sua cauda que se prolonga em um cordãozinho,
apêndice este que, em caso de perigo, se for presa por ele, corta-o de uma
dentada, abandonando-o, e durante vários minutos fica esse apêndice se
retorcendo entre saltos, como uma minhoca que acabou de ser desenterrada.
Recebe toda a
luz e a recria, transformando-a em reflexos e cores. Até mesmo o sol parece observá-la
fixamente, e esse olhar do sol também a captura e, como se fosse um espelho,
projeta-a aumentada. Ela toda é uma obra de arte acabada e perfeita, fruto de
um artista mágico... Até a pedra na qual repousa, cinza e opaca, contribui para
realçá-la.
Vendo essa talha
inimitável, vem à minha lembrança uma lenda de terras astecas, lida não me
lembro onde e chamada“A Lagartixa de Esmeraldas”:
“Era uma vez um
padre santinho que morava ao pé de uma serra, entre as inocentes criaturas do
Senhor, e a quem todos os pobres da região acudiam em suas aflições. Em uma
manhã como esta, um índio necessitado de algo com que matar a fome de sua mulher
e de seus filhos recorreu a ele. Encontrou-o numa trilha, perto de sua casa, e
com a voz angustiada lhe contou suas dores, pedindo ajuda para aliviá-las.
O bom santinho
que, por tudo dar, nada tinha, sentia-se comovido por tanta miséria, e
profundamente entristecido por não poder remediá-la; e assim, comovido e
abalado, começou a implorar a Graça Divina. Enquanto rezava, olhando ao seu
redor, seus olhos se detiveram em uma lagartixa que tomava sol ao seu lado, e
estendeu sua mão até ela, pegando-a suavemente. Com o contato dessa mão
milagrosa, a lagartixa se transformou em uma joia de ouro e esmeraldas que foi
entregue ao índio, dizendo-lhe: “Pega e vai até a cidade, pois, em alguma casa
de penhores, algo vão te dar por isso”.
O índio obedeceu
e, com o que conseguiu, não só acabou com a sua fome e a da sua família, mas
também pôde comprar umas terras que depois progrediram. Anos mais tarde, quando
a sua situação melhorou, achou que devia devolver ao legitimo dono aquela joia que tanto bem lhe
tinha feito.
Ele a recuperou
e, em uma linda manhã de verão, voltou com a joia à procura do santinho, o qual
encontrou no mesmo lugar da primeira vez, ainda que muito mais velho e, como se
fosse possível, ainda mais pobre.
- Santinho
querido - disse-lhe o índio. Aqui lhe devolvo esta joia que um dia o senhor me
deu e que tanto me serviu. Já não preciso dela, fique com a joia e talvez sirva para
ajudar outra pessoa. Muito obrigado e que Deus o abençoe...
O velhinho já
não se lembrava de nada. Com ar distraído, ele a pegou, deixando-a suavemente
sobre uma pedra. Novamente e, pelo milagre de suas mãos, aquele objeto precioso
voltou a ser o que antes tinha sido, uma lagartixa, que começou a andar
lentamente em direção ao seu refúgio.