sábado, 30 de abril de 2011

SOBRE ERNESTO SÁBATO (24/06/1911 - 30/04/2011)



Entrevista concedida pelo tradutor Janer Cristaldo à professora Inês Skrepetz

Inês Skrepetz - Você acha que Ernesto Sábato é um intelectual humanista? Por quê? 

Janer Cristaldo - Todo intelectual sempre se pretende um humanista. Tanto os marxistas cuja filosofia massacrou cem milhões de pessoas em busca do homem novo e da sociedade justa, quanto os nazistas que mataram outros tantos em nome da pureza racial. Sábato começou sua vida como militante comunista. Certamente se considerava um humanista naqueles dias. E certamente continuou se considerando humanista quando percebeu seu equívoco e passou a criticar o comunismo.

IS - O que você entende por humanismo no século XXI?

JC - Humanismo é uma palavra-ônibus, que transporta um monte de significados. Tentando cercar a palavrinha, peço auxílio a Ferrater Mora. Resumindo: a palavra foi usada a primeira vez em 1808, em alemão (Humanismus), pelo educador bávaro F. J. Niethammer, que entendia o conceito como a tendência a destacar a importância do estudo das línguas e dos autores clássicos. A palavrinha migrou para a Itália (umanista) para designar os professores das chamadas “humanidades”. Humanista era um homem ligado às artes liberais, ou seja, história, poesia, retórica, gramática e filosofia moral.

Na época atual, segundo Mora, fala-se de humanismo para designar também certas tendências filosóficas, especialmente aquelas nas quais se põe em relevo algum “ideal humano”. Como os ideais humanos são muitos, proliferaram os humanismos. Teríamos assim um “humanismo integral” (Maritain), um humanismo liberal, um humanismo existencialista, um humanismo científico e várias outras derivações. Algumas tendências humanistas priorizam a noção de “persona”, em oposição a idéia de indivíduo. Outras se caracterizam pela noção de sociedade aberta, em oposição à sociedade fechada. Outras, por destacar o caráter social do ser humano. Outras, por colocar em destaque que o homem não se reduz a uma função determinada, senão que é uma totalidade.

Afirmar que Sábato é um intelectual humanista, não é incorreto. Mas não quer dizer grande coisa.

IS - Na obra A Resistência, escrita em 2000 (p.100), Sábato faz uma reflexão crítica ao humanismo. Estaria ele negando ou buscando formular um novo conceito de humanismo?

JC - Deste caso específico não poderia falar. É o único livro dele que não li. De qualquer forma, como todo escritor, mais dia menos dia teria de abordar o assunto. Em entrevista que me concedeu nos anos 70, Sábato dizia que Marx foi um dos que mais lutou com seus livros contra a escravidão no mundo capitalista, especialmente na Inglaterra vitoriana com a qual conviveu, e tem partes filosoficamente de valor. “Também devemos reconhecer, frente ao homem abstrato de Hegel, alheio à terra e ao sangue, a frase de Marx : ‘O homem não é um ser abstrato, fora do mundo: é o mundo dos homens, do Estado, da sociedade’. Sua consciência é uma consciência social, enunciando assim um novo humanismo frente às enteléquias iluministas e racionalistas tipo Voltaire”.

Se Sábato rompeu com o comunismo, sempre lhe resta uma certa nostalgia do marxismo. Em Três Aproximações à Literatura de nosso Tempo, escreve: “Marx enuncia os princípios de um novo humanismo: o homem pode conquistar sua condição de "homem total" levantando-se contra a sociedade mercantil que o utiliza. Ele, como Camus, descendentes de Pascal, exerceram este mesmo humanismo áspero, essa mesma repugnância pelo engano e o auto-engano, para auscultar o homem conturbado pela grande crise de nosso tempo”.

Em Homens e Engrenagens, repele o antigo conceito de humanismo: “No momento em que o humanismo se extasia com a antigüidade, no momento em que faz de seu culto um jogo cortesão e refinado, torna-se conservador e reacionário: técnicos como Leonardo, os homens que melhor representam o espírito da modernidade, verão como charlatães esses senhores que passavam o dia discutindo na Academia, esses pedantes que haviam voltado as costas à linguagem popular para entregar-se à vã ressurreição do latim, esses presunçosos que haviam deixado de chamar-se Fortiguerra ou Wolfgang Schenk para converter-se, grandiosamente, em Carteromachus e Lupambulus Ganimedes. Desta forma, o humanismo passa do tema da liberdade ao tema do dogma, ao dogma da antigüidade. E da revolução passou à reação”. 

IS - Qual a relação de Sábato com o existencialismo? 

JC - Diria que nenhuma. O existencialismo é uma corrente filosófica e Sábato, embora discuta filosofia, nunca se pretendeu filósofo nem aderiu a qualquer doutrina. Mas há muito em Sábato, particularmente em Informe sobre cegos, de um movimento artístico do início do século, o surrealismo, influência de seu convívio com Oscar Dominguez e André Breton em Paris. Em Homens e Engrenagens, confessa: "Ali, em 1938, soube que minha fugaz passagem pela ciência havia terminado. Embora o doutor Jekill ainda medisse a radiatividade do actínio durante o dia, Hyde vagava noturno e solitário pelas ruas de Paris, ou começava a escrever as páginas de um romance catártico ou se revolcava na pura irracionalidade, promovendo escândalos com os pintores surrealistas. Como compreendi então o valor moral do surrealismo, sua força destrutiva contra os mitos de uma civilização finda, seu fogo purificador, mesmo apesar de todos os farsantes que se aproveitavam de seu nome!"

Mas, escritor atento a seu tempo, também se preocupou com o existencialismo. É ainda em Homens e Engrenagens que escreve: “Tanto que naquelas cidades nórdicas, formadas em torno das fortalezas feudais, o surgimento da nova civilização iria se realizar com atributos mais bárbaros e modernos, em cidades essencialmente mercantis, com as mais típicas características do capitalismo moderno. Mas ao mesmo tempo, paradoxalmente em aparência, seriam o berço das reações mais violentas contra a nova civilização: o romantismo e o existencialismo”. 

Volta ao assunto em Três Aproximações: “O existencialismo, e em geral o romantismo, é a revolta dos elementos femininos da humanidade”. 

IS - Para Sábato, seria o existencialismo um humanismo, como defendido na obra de Sartre?

JC - Estou hoje distante da obra de Sábato, em todo caso não lembro de ter lido nenhuma declaração sua neste sentido. Verdade que em "Sartre contra Sartre ou a missão transcendente do romance", um dos ensaios das Três Aproximações, o ensaísta argentino vai dedicar seu tempo a esmiuçar o pensamento sartriano. Mas sua preocupação não é o humanismo, e sim o fato de que, em abril de 1964 Sartre renegou sua obra de ficção, afirmando que um romance como A Náusea não tem sentido algum quando em alguma parte do mundo há uma criança morrendo de fome. 

Sábato indigna-se com tal postura: “É quase inimaginável que um pensador do porte de Sartre tenha chegado a pronunciar por convicção teórica tal precariedade. E como em alguém de sua honradez intelectual é impossível a demagogia, não resta senão a hipótese sobre a oculta (e para ele culposa) antinomia que existe entre sua visão filosófica e sua militância política. Senão, como explicar de outro modo que um intelecto como o seu não observe que esta tese conduziria não só ao repúdio de um romance metafísico como também à extirpação da arte, da ciência pura e da filosofia em sua totalidade? De que modo pode salvar uma criança, nem tanto a música de Bach mas a teoria de Einstein ou a fenomenologia de Husserl? A aplicação conseqüente do critério sartriano nos obrigaria a renunciar às mais altas atividades do espírito para combater apenas por ideais políticos”.

Quanto ao existencialismo sartriano, Sábato é cheio de dedos. Escreve em Heterodoxia:

“O homem só tem fé no racional e abstrato, e por isso se refugia nos grandes sistemas científicos ou filosóficos; de maneira que quando este Sistema vem abaixo - como mais cedo ou mais tarde acontece - sente-se perdido, cético e suicida. A mulher confia no irracional, no mágico, e por isso dificilmente perde a fé, porque o mundo jamais pode revelar-se mais absurdo do que ela o intuiu pela primeira vez. o credo quia absurdum é feminino, como toda a filosofia existencialista (embora seja feita por homens; por homens, bem entendido, fortemente propensos à feminilidade). Racionalizar o universo e Deus é empresa tipicamente masculina, loucura própria de homens. Por esta razão, não creio no existencialismo de Sartre. Sua chave mais profunda deve ser buscada em seu primeiro romance, em sua náusea ante o contingente e gelatinoso, em sua propensão viril pelo nítido, matemático, limpo e racional. Sua obra filosófica é o desenvolvimento conceitual desta obsessão subconsciente. Este desenvolvimento leva fatalmente a uma filosofia racionalista e platônica”.

Ainda no mesmo livro: “Como a criança teme a escuridão, o homem teme o Caos Universal. (...) Uma vez lá, no refúgio de alta montanha, acabamos por almejar a vida, não obstante ou mesmo por sua sujidade e sua desordem, e assim voltamos do pensamento puro à vida e ao romance. O existencialismo é uma volta ao perigo e não se deve estranhar que suas palavras mais usuais sejam vertigem e angústia”.

Tampouco acredita na sistematização do existencialismo: “Jaspers precedeu Heidegger, Marcel precedeu Sartre. Mas não se acredita senão no sistemático. Por outro lado, sistematizar o existencialismo é tão espantoso como codificar o surrealismo, da maneira como Breton o fez, inaugurando essa espécie de Academia dos Bons Costumes no Inferno”.
IS - Quem é Sábato para Janer Cristaldo?

JC - Foi um bom acontecimento em minha vida. Em Buenos Aires, certo dia, comprei Sobre Héroes y Tumbas. Fui a um bar, creio que na Lavalle com Suipacha, para um "trago largo". Abro o livro e me deparo com a nota policial que abre o livro: um crime e um suicídio ocorridos em circunstâncias misteriosas, frutos aparentemente de um gesto de loucura. Mas certas inferências conduziam a uma hipótese mais tenebrosa, em virtude de um estranho "Informe sobre Ciegos" que Fernando Vidal Olmos havia concluído na noite de sua morte. 

Não interrompi mais a leitura. Mais ainda, comprei todos os demais livros do autor. Passei aqueles dias todos em Buenos Aires, mergulhado na leitura de Sábato. E ainda mais: comprei outros exemplares de cada livro para presentear amigos. 

Em Abbadón, el Exterminador, encontrei esta mensagem jogada ao mar, dirigidas a "un querido y remoto muchacho".

"Te desanimás porque no sé quién te dijo no sé qué. Pero ese amigo o conocido (que palabra más falaz!) está demasiado cerca para juzgarte, se siente inclinado a pensar que porque comés como el es tu igual; o, ya que te niega, de alguna manera es superior a vos. Es una tentación comprensible: si uno come con un hombre que escaló el Himalaya, observando con suficiencia como toma el cuchillo, uno incurre en la tentación de considerarse su igual o superior, olvidando (tratando de olvidar) que lo que está en juego para ese juício es el Himalaya, no la comida. Y por eso tan pocas veces el creador es reconocido por sus contemporáneos: lo hace casi siempre la posteridad, o al menos esa espécie de posteridad contemporánea que es el extranjero. La gente que está lejos. La que no ve cómo tomás el café o te vestis”.

Isso foi em 75. Na época, eu andava um tanto desbussolado. Estava pensando em isolar-me do mundo e cheguei a fazer concurso para trabalhar em um farol na costa brasileira. Escrevia, mas sem muita convicção. Escrevi a Sábato, pedindo permissão para traduzir aquele capítulo de Abbadón. Enviei-lhe junto um artigo que escrevi sobre a descoberta de sua obra. Não tinha muita esperança de resposta. Para minha surpresa, uma semana depois, daquele homem que eu imaginava encerrado em algum hospício, com camisa-de-força, recebi uma afável carta. 

Santos Lugares, 1 de agosto de 1975

Mil gracias, querido y generoso Cristaldo, por su hermosa carta, por sus buenos deseos, por todo. Y además por su artículo en el diário.

Espero que en próxima correspondência me envie algo de lo que escribe, aunque, lamentablemente, mi conocimiento del português es muy precário: puedo leer con pleno sentido um ensayo, pero difícilmente uma obra narrativa, en queel lengua es mucho más rico y sutil.

Lo que recomendo su amigo argentino (“Deixe de pesquisar Sábato e pesquise seu próprio interior”) es válido en algun sentido, no en outro. Entiéndame que no hablo de mi obra, pues podría ser la obra de todos los escritores que sobre usted han tenido y tienen influencia: el conocimiento de uno mismo pasa por el conocimiento de los demás, y particularmente por el de los seres que han ahondado en la condición del hombre; esa es la dialéctica existencial que nos rige y que Kierkegaard expresó diciendo, más o menos: “Más ahondamos em nuestro corazón, mas ahondamos em el corazón de los otros”. Y reciprocamente, cabría agregar. En lo su amigo tiene plena razón es que no debe limitarse a un autor.

Sí, mi obra no es conocida en Brasil. Pues la edición de EL TUNEL está agotada y no se reedito jamás. Y HEROES salió en Portugal. De la edición brasilera nada sé, pues parezco condenado por alguna maldición. Fuera de lo sobrenatural, hay algo muy simple: no pertenezco a ninguna logia o máfia literária, vivo en un Rincón del mundo y no tengo um agente literario como la senõra Carmen Balcells, que promueve casi militarmente las obras del grupo de Cortázar, Fuentes, V. Llosa y G. Márquez. 

Qué le puedo hacer, así es mi destino. Hace tiempo que me he resignado a este destino de soledad, al queyo mismo me he condenado por mi independencia política e por mi resistência a apoyar movimientos de moda, tanto en lo político como en lo literário. Si relee la “carta a un remoto joven” lo comprenderá.

Si usted puede hacer algo para que esa misteriosa editorial brasilera Artenova acelere la edición de HÉROES, le quedaré muy agradecido. Em cuanto a lo que me propone com EL ESCRITOR Y SUS FANTASMAS, le mandaré pronto las pruebas de galera de uma edición totalmente rehecha, que es la que será traducida en algunos países europeus. Mientras tanto, te envio un librito mío como pequeño testimonio de profundo reconocimiento y de afectuosa amistad.

E. Sábato


Fiquei perplexo com a atenção que o escritor me concedia. Ao que tudo indicava, o homem não estava em camisa-de-força. Daí decorreu uma longa amizade, encontros em Santos Lugares, Buenos Aires, Paris e São Paulo. E uma correspondência de meia centena de cartas, de parte a parte. Quando me candidatei a uma bolsa em Paris, decidi que estudaria sua obra. Antes de partir, como tomava um navio em Buenos Aires, fui visitá-lo.

O convite de traduzir toda sua obra ocorreu quando estava em Paris. Comecei comSobre Héroes y Tumbas, retraduzi El Túnel e avancei por Abbadón e seus ensaios. Traduzir um autor complexo como Sábato - pelo menos que diz respeito à sua ficção – é sempre um desafio. Para mim era uma forma de unir o útil ao agradável. Se pretendia desenvolver uma tese sobre o argentino, a tradução me obrigava a lê-lo vírgula a vírgula.

A tradução de Sábato no Brasil teve muitos percalços. Os direitos autorais estiveram em mãos de pelo menos duas editoras, sem que nada fosse publicado. Sábato acabou assinando contrato com a Francisco Alves, do Rio e convidou-me para traduzi-lo. Eu estava terminando a tradução de Héroes, quando o professor Deonísio da Silva, da UFSCAR, me envia uma nota do Jornal do Brasil, que dizia este livro já estar em fase de impressão. Comuniquei-me com Sábato. Sua resposta:

11 de setiembre
Mi querido Cristaldo:

La condición que puse a Editora Alves es que se empleará su traducción o ninguna outra. Estoy esperando ahora la respuesta, pero sin duda será así. Estaremos en Paris desde el 1º de noviembre hasta el 10, em el Hotel d’Isly. Um abrazo muy fuerte y cariñoso para los dos,

E. Sábato


Sei lá que intrigas ocorreram, mas foram conjuradas. Meu orientador jamais ouvira falar nem do autor nem de sua obra. Depois de minha tese, escreveu um livro sobre Sábato e saiu a fazer palestras sobre ele na Europa. Ou seja, contribui um pouco para a educação de meu professor e para uma maior difusão de Sábato no velho continente.

Que representa hoje Sábato para mim? Foi uma boa experiência conhecê-lo, foi um belo desafio traduzi-lo. Foi um interlocutor fascinante e muito me honra ter merecido sua amizade.

IS - Dentro da sua autoridade como tradutor de Sábato, como você compreende a produção literária deste autor, tão marcada pelos seus romances e, no entanto, que produziu muito mais ensaios e críticas do que propriamente Literatura?

JC – É um dos mais importantes escritores latino-americanos, que por muito tempo foi sabotado pelas esquerdas, por ter ousado denunciar o comunismo. Houve época em que, ao falar-se em literatura latino-americana, dizia-se: Borges, Cortázar, Garcia Márquez, Vargas Llosa, etc. E só. Cheguei um dia a perguntar a Sábato se não estava escrevendo com o pseudônimo de Etc.

Tendo escrito apenas três ficções em sua vida, conseguiu um grande momento na ficção latino-americana, com Sobre Hérois y Tumbas. Mas cometeu um grave equívoco em Abbadón, ao fazer o hagiológio de um dos mais frios assassinos do continente, seu conterrâneo Ernesto Che Guevara. Pelo jeito foi uma recidiva de seus dias de marxismo. Em minha tese sobre Sábato e Camus, Mensageiros das Fúrias, dediquei um capítulo a esta parte do livro. Na época, eu considerava que um escritor, uma vez que toma um personagem histórico como personagem, tem todo direito de pintá-lo a seu modo. Hoje, não penso assim. Embarquei no equívoco do outro Ernesto.

Sábato nasceu em 1911, seis anos antes da Revolução de 17, que se pretendia a redenção da humanidade. Em sua juventude, não se tinha conhecimento dos crimes de Lênin e muito menos, mais tarde, dos crimes de Stalin. Estes só começaram a ser conhecidos em meados dos anos 30. Ora, em 1930, Sábato participava ativamente do Partido Comunista argentino.

Em 1934, começam suas discordâncias políticas e filosóficas com o marxismo, o que faz com que os dirigentes do partido o enviem às Escolas Leninistas de Moscou, mas antes deve participar do Congresso contra o Fascismo e a Guerra, em Bruxelas, presidido por Henri Barbusse. Encontra-se com dirigentes do mundo todo e confirma suas suspeitas, que culminam com o começo dos "processos" de Moscou. Decide fugir do congresso e vai para Paris, onde passa o inverno de 34-35 na clandestinidade e na miséria. Rompe com o Partido, que abandona lá por 35 ou 36, por ocasião das primeiras purgas de Stalin. Foi quando desceram do barco Camus, Koestler, Gide, Ignazio Silone, Louis Fischer, Stephen Spender, Richard Wright. Desde então, Sábato tem sido um crítico feroz dos regimes totalitários socialistas.

Foi um homem que viveu as contradições do século que percorreu desde o início. Foi honesto quando passou a militar no Partido e mais ainda quando o abandonou. Sua ruptura: "Enojado com a escravidão moral, intelectual e física que o stalinismo impunha, consciente do divórcio que provocava entre a realidade de nosso país e o regime soviético e, enfim, tendo tomado consciência de que muito pouco restava da teoria marxista na escolástica que se injetava na Rússia, inclusive com tortura e morte, acabei por deixar o movimento pelo qual havia abandonado família, estudos e segurança. Nos quase quarenta anos então transcorridos, jamais reneguei os ideais de justiça social e de liberação nacional, como creio ter provado através de minhas atitudes públicas".

É escritor que não morre. Sobre Héroes é definitivamente um clássico da literatura do continente.
Fonte: http://cristaldo.blogspot.com
 

quarta-feira, 13 de abril de 2011

13 de abril: Dona Ivone Lara, dama do samba, completa 90 anos

Grande dama do samba no Brasil, Dona Ivone Lara completa hoje 90 anos com um certo desalento em relação à profissão.
Depois de enfrentar desafios como a perda dos pais ainda criança, a luta contra o preconceito ao ser a primeira mulher a compor um samba-enredo e se firmar como nome expressivo na música brasileira, ela se queixa de um desrespeito do mercado fonográfico.
Dona Ivone diz que seus discos não são mais promovidos pelas gravadoras e têm distribuição restrita.
No último trimestre, diz ter recebido R$ 74 reais em direitos autorais pelas músicas executadas no exterior, enquanto está sempre sendo convidada para shows na França, Japão e Alemanha.
Com cerca de 15 canções inéditas, feitas nos últimos anos com seu principal parceiro, Delcio Carvalho, 72, ela não se anima em gravá-las. "Não apareceu nenhuma boa proposta", diz. 

Paula Giolito/Folhapress
A sambista Dona Ivone Lara em sua casa no Rio de Janeiro
A sambista Dona Ivone Lara, que completa 90 anos desiludida com a profissão, em sua casa no Rio de Janeiro

O lamento parte de uma compositora reconhecida nacional e internacionalmente. Suas músicas já foram gravadas por Gilberto Gil, Maria Bethânia e Caetano Veloso.
Composições como "Acreditar" ("A vida foi em frente e você simplesmente não viu que ficou pra trás...") e "Alguém me Avisou" ("Eu vim de lá, eu vim de lá pequenininho...") são presença obrigatória nas rodas de samba.
Para Paulinho da Viola, o que a diferencia é um estilo próprio. "Em termos melódicos, a música é maravilhosa, algo que qualquer grande compositor gostaria de fazer. É uma honra tê-la no cenário musical brasileiro."
Dona Ivone geralmente cria as melodias e seus parceiros fazem as letras. Hermínio Bello de Carvalho diz que certa vez lhe entregou alguns versos e em uma hora já estava pronta a música "Mas Quem Disse que Eu te Esqueço", inclusive com ajustes na letra que ele fez.
"Ela é compositora, instrumentista, e uma tremenda passista. Tudo isto a qualifica para ser a primeira-dama do samba", diz o músico.
Hoje, mesmo com dificuldade de locomoção após ter fraturado o fêmur e se recuperando de uma depressão depois da morte do filho, em 2008, ainda faz shows.
Em parte, esta atividade tem a ver com questões financeiras, já que apenas a aposentadoria como funcionária pública e os direitos autorais não lhe garantem sustento pleno.
Mas também tem a ver com sua incrível vitalidade. "Não me sinto cansada, pelo contrário, se eu não fizer nada é que fico chateada com isto, fico até triste.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/901664-dona-ivone-lara-dama-do-samba-completa-90-anos.shtml